sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Semanídio


Eu certamente poderia passar uma semana no para-peito da janela do quarto analisando o movimento.

E em semanas póstumas me acompanhariam os livros, o cachorro, e por fim o telefone que me inserisse de alguma forma no meio externo de pó.

Passado um mês de semanas gradativa e saborosamente ociosas, sentiria a ânsia de me locomover ao movimento dantes analisado.

Enquanto iria à rodovia a qual passava o vendedor de acarajé alto e mestiço, o casal de velhos na velharia do jogo de damas da esquina permaneceria frente a frente, cara a cara, peito a peito.

Enfim encaixei-me no caixote de cimento podre, e esperei a batida...

A mesma carroça, o mesmo bode, o mesmo bonde, e um cheiro de dendê.
Um cheiro.

Minha vida mudando desde que estivera metros abaixo da minha janela. O mundo era cego, ninguém me via. Pedi pão: ninguém me ouvia.

E na nova semana me levantei, e me arrastei pelos cabelos de Rapunzel rumo ao meu para-peito de metro e meio...

...E dali voei. Voei e o mundo gritou pra mim, e eu para o mundo.

O mundo que era meu, o mundo que mudou. O mundo que, ai Deus!, por fim acabou.

7 comentários:

  1. ain que lindoo, eu lembrei agora de você me explicando esse conto!

    adorei, adorei

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  2. Deve ser perfeito saber a explicação desse conto... mas fico com o mistério implacável =)

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  3. é só a história de alguém que se sente preso pela monotonia. e que de repente, de alguma forma, liberta-se.

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  4. um dia, quando eu tiver coragem, conto aqui como fiz esse texto. foi algo tão inusitado e repentino, que esse texto tornou-se o meu preferido!

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  5. É a libertação do cotidiano, da fuga bucólica aos arredores de uma cidade situada a movimentação rapidez e irracionalidade, estar sempre ao topo, esgueirando uma janela não é um sentimento voyeur.Adorei, emocionante!

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